sábado, 31 de julho de 2010

Branca de Neve


O folhetim judiciário do Caso Freeport faz lembrar a polémica “obra ao negro” de João César Monteiro, “Branca de Neve”, em que a páginas tantas deixa de haver imagem e o écran passa a escuro operando-se uma espécie de mistificação cinematográfica no que deixa de ser um filme para passar a ser um registo sonoro envolto em trevas.
Ora também neste caso temos um “filme” que se iniciou brumoso e acaba (?!) tenebroso, deixando às escâncaras o “bambúrrio” em que está tornado o aparelho judicial português, mormente o Ministério Público, em que da dialéctica dos movimentos antagónicos de “descobrir” e “encobrir” resulta um espectáculo público muito pouco dignificante, cuja conclusão é “que nem o pai morre, nem a gente almoça”, pois nem “aos costumes se diz nada”- em termos processuais, nem em termos de conclusão política o termo do caso se vislumbra.
Como aprendi há mais de trinta anos na Faculdade de Letras ao assistir à exposição de um genial trabalho de Estética, designado "Do Eterno Feminino", há "encobrimentos" que descobrem, "descobrimentos" que encobrem e slides em branco que bem podem suscitar a nostalgia por D. Sebastião, o Encoberto.
É notório o clima de “embrulho” interno, de “desaguisado”, de mal-estar e de falta de orientação e de concatenação hierárquica, nomeadamente com elementos da PJ, e de aceitação de directivas que perpassa por todo este caso. É notória a insuficiência de conclusões, a suspeita de orientação política do caso e as manobras cruzadas de imputação dessa manipulação (como no clássico ladrão que grita “agarra!”). Parecem, e nestas coisas o que parece é, existir grandes pressões para dar o caso por concluído e daí o despacho de arquivamento, sem que essa decisão esteja suficientemente sustentada e daí resistências internas ao seu acatamento do tipo Patilhas & Ventoinha “ - Sim Chefe. Contrariado, mas vou…”. Por outro lado esse arquivamento não será definitivo, se os Assistentes entretanto constituídos (e vá-se lá também a saber porquê?) insistirem em o “desenterrar”.
Entretanto sabe-se que há largos milhões sem rasto, sabe-se que houve reuniões, autarcas, empresários, intermediários, famílias, “pinóquios” e uma série de trapalhadas por desmontar. E muito fica por esclarecer, como se depreende das muitas perguntas, deliberadamente incluídas na peça e que ficaram sem resposta…
Vamos ter cenas dos próximos capítulos, o mais tardar numa época pré-eleitoral perto de si e o mais que pode acontecer à história é virar “Bela Adormecida”!

segunda-feira, 26 de julho de 2010

Sai uma "terceira"!


Uma "terceira" ou um "copo de três", era, nos tempos da minha meninice, um pedido muito comum (era mesmo o mais comum) aos balcões das tabernas. Designava um copo de vinho que, ainda assim, não era muito grande, não chegava aos dois decilitros - o, mais actual, penalty tem muito mais capacidade pois é um copo para água que se enche de vinho. O "copo de três" ou "terceira", como ouvia dizer aos homens desse tempo, era "curto" e também havia o "copo de dois" que ainda era mais pequeno, mas curiosamente ninguém lhe chamava "segunda". O problema não era a diminuta capacidade dos copos, mas a quantidade de vezes que se enchiam e se emborcavam.
Havia sempre um bom motivo para mais uma "rodada", ou porque saía um "compincha" e antes de sair, pagava uma , ou porque entrava mais um "conviva" e ao entrar, pagava outra; ou porque alguém de entre os presentes fazia anos, ou porque o filho ou a filha de alguém fazia anos, e quem diz o filho ou a filha; diz o neto ou a neta, ou mesmo o bisneto ou a bisneta; ou pela alegria do nascimento; ou pela dor da morte; ou porque era paga uma aposta; ou na sequência do jogo das moedas; ou porque o clube de alguém ganhava; ou porque o de outrém perdia; ou ainda quando empatavam, cada um pagava a sua para ninguém se ficar a rir. Bebia-se para "esquecer", mas também para evocar, brindava-se aos presentes e aos ausentes; à saúde dos vivos e à memória dos mortos; para soltar a palavra de que não se tinha o "dom", mas de que se usava mesmo assim. Caso exemplar o da personagem do actor Santos Carvalho na "Canção de Lisboa" quando afirma: - "Eu não tenho palavras, eu não tenho vinho!" - estendendo o caneco para a botija.
Bebia-se de entrada, mas também de saída, para a "sossega" e para o "caminho" (uma "saídeira" como mais tarde se viria a dizer).
Egrégio testemunho desses tempos em que ninguém receava ser apanhado em "flagrante de litro", o meu avô Agostinho, "Doutorado" em Alcoólicas e Petisqueiras, ramo do saber afim, mas menos radical do que as "Alcoólicas e Bagaceiras", sócio n.º 1 do "Manel da Galega", que achava na sua imensa sabedoria, que o nome de "Faculdades" dado às Escolas Superiores estava "mal posto", pois assim "dava a ideia que era fácil", por isso deveriam designar-se "Dificuldades" (A "Dificuldade" de Medicina, a "Dificuldade" de Direito, de Ciências, de Letras e por aí fora), filosofava assim:
"Cerveja é água com gás (ou pior, mijo de gato), branco é refresco, vinho, vinho só tinto"!
E mainada!!!"Anda Pacheco!!!"
Vai uma rodada?!

terça-feira, 20 de julho de 2010

"You`re Fired !!!"


Aquilo que por comodidade de linguagem se costuma chamar "Passos Coelho", quer dizer os interesses que a actual direcção do PSD representa, veio anunciar um autêntico golpe de Estado constitucional ao propor rever a Lei Fundamental introduzindo a possibilidade de "poupar" nas eleições, tornadas dispensáveis por passar a permitir ao Presidente da República demitir o Governo sem dissolver o Parlamento. Por uma vez dou razão a Santana Lopes, não pela história do PPD/PSD em especial, mas pela história recente de Portugal, visto que uma revisão constitucional deste teor constituiria um evidente retrocesso e um enfraquecimento objectivo do sistema democrático.
Mas como um "coelho" dá sempre vários "passos", este não se fica por aqui e pretende acabar de vez com uma das muitas coisas que, por muito que a camarilha do costume com elas costume encher a boca, nunca existiu a sério em Portugal - o Estado-Providência (providências cautelares sim). Para isso pretende-se "limpar" da Constituição as referências à tendencial gratuitidade da Saúde e da Educação, mesmo quando se trata de algo pouco mais do que simbólico. Aliás o "tendencial" já é fruto de uma anterior revisão constitucional.
Mesmo assim e como já disse o velho Heraclito: "é preciso que lutemos pela Lei, como pelas muralhas da cidade" - e que defendamos os direitos de todos.
Mais e "melhor", a autêntica "cereja no topo do bolo", a pretensão de trocar no texto constitucional a disposição que interdita o despedimento sem justa causa, pela sua possibilitação por "razão atendível" ou seja, pela simples invectiva dos filmes americanos: "You`re fired !!!"
Enfim o Passos é um "coelho" "pragmático", mas quer meter o chumbo no coiro do pagode e não se trata apenas de "parole, parole, parole".
Brecht disse que "cada povo tem o teatro que merece". Mas serão estes os nossos (neo)liberais. Não são a sério, pois não?!
Em Portugal não houve Feudalismo a sério, nem Absolutismo a sério, nem Liberalismo a sério, nem República a sério, nem Fascismo a sério, nem Revolução a sério, nem Capitalismo a sério, nem há Democracia a sério.
E no único país em que há "touradas", pois onde são a sério chamam-se "corridas de touros", porque seriam sérios os "coelhos" e os seus "passos" e por alma de quem haveriam de transcender a única coisa a sério que existe por cá: a máfia sonsa que constitui a nossa classe dominante.
Post-Scriptum:
Esperemos que aquilo a que, também por comodidade de linguagem, se costuma chamar "José Sócrates", o não aceite, ainda que fazendo a rábula do inicial estado de indignação.

segunda-feira, 19 de julho de 2010

Theatrum Politicum


No folhetim das Scuts, que parece ter mais episódios do que uma telenovela, os Partidos do "arco da governação", mormente os do "Bloco Central", persistem na atitude clássica de quem "não ...., nem sai de cima", mostrando, sobretudo o PSD, muita ronha e "sonsice" nas "soluções" apontadas que não são, de modo algum, soluções. Um pouco à semelhança das "borlas" para a Expo 98 - a cada português, por isto ou por aquilo (ser autarca, bombeiro voluntário, membro de uma sindicato ou associação patronal, cultural, de beneficência, etc. etc,), há-de ter calhado pelo menos uma. Também no caso das Scuts parece que vão ser mais os isentos do que os pagantes, ou seja, estes últimos vão resumir-se aos "otários" do costume, que já pagam tudo o resto (impostos, etc., etc.).
Mais uma vez, o tão decantado "Princípio da Universalidade" será aplicado à boa maneira de Blair (não o Tony, mas o Eric, mais conhecido por George Orwell): "todos somos iguais, mas alguns são mais iguais do que os outros".
O representante de uma das "Comissões de Utentes" que se opõem à introdução de portagens declarou aos media que estes impasses político-legislativos até são positivos, pois "grão a grão enche a galinha o papo". Cá para mim fez uma confusão "proverbial", deveria ter, antes, dito: "enquanto o pau vai e vem, folgam as costas".
Mas é mais que certo que no fim da encenação e quando já não houver mais folga, bem podemos "esperar pela pancada".