Vemos, ouvimos e lemos, não podemos ignorar. É óbvio que está em curso uma tentativa de "salazarização" do país, traduzida por uma cascata de medidas, ou anunciadas medidas. Muitas vezes, de acordo com a linguagem do Primeiro-ministro, para testar a sua possível "aderência à realidade" (quer dizer: atirar barro à parede, para ver se pega). Desta vez é o novo "conceito estratégico de segurança e defesa nacional" que, invocando uma pretensa "racionalização de meios", mais não visa do que operar uma regressão histórica de, pelo menos, quarenta anos e esvaziar a PSP de competências de segurança interna para as entregar à GNR. Assim, a PSP ficaria reduzida a pouco mais que uma "polícia de giro", enquanto a GNR teria o monopólio do Corpo de Intervenção, da luta antiterrorista e do controlo de manifestações, por exemplo. Ora, esta pretensão, no actual contexto, nada terá de "inocente", a juntar ao empobrecimento galopante, ao regresso da "caridadezinha", com o coro afinado de "ulrichs" e "jonets", entre os "ai aguenta, aguenta" e os "bifes", já só faltava o retorno, rapidamente e em força, do esplendor da GNR aos seus "tempos de glória".
Estão a juntar-se os ingredientes para a neo-salarização, por minagem e desmantelamento progressivo dos mecanismos da democracia que julgávamos consolidada. Agora sem o "cimento ideológico" que caracterizou o "original" dos anos 30. O "mestre" afirmava saber bem o queria e para onde ia. Estes fracos discípulos, sabem o que querem, mas não sabem para onde, nem como, hão-de ir. Arriscamo-nos a, no fim desta louca aventura, não restar pedra sobre pedra. Afinal estamos na era do "pensamento débil"... É o Passos sem metafísica.
A "Europa" não é estranha a este propósito. À boleia das assimetrias económico-financeiras entre o "Norte" e o "Sul" regressam as velhas assimetrias políticas que durante décadas "justificaram" que Portugal, Espanha e Grécia estivessem, ao contrário dos países desenvolvidos do continente, sujeitos a férreas ditaduras para as quais a "Europa" de então se esteve a "borrifar" (para não dizer algo mais vernáculo"), pois no ver "iluminado" dessas mesmas potências, não estávamos "preparados" para a democracia. Agora, por obra da "crise", parece que voltamos a não estar.
Mas, para voltar à GNR, mesmo querendo ser optimista (nem "piegas", nem "velho do restelo", longe vá o agoiro) e concordando com a vetusta sageza de Heráclito de Éfeso quando afirma que "tudo muda", talvez influenciado pela memória de ter vivido numa terra (o Barreiro) ocupada e mantida manu militari pela GNR até ao 25 de Abril de 74, temo que a tradição pretoriana possa voltar a ser o que era e acorde velhos demónios.
Afinal basta recordarmos onde se refugiou Marcelo Caetano e alguns dos seus mais próximos nesse preciso dia...