sexta-feira, 21 de novembro de 2008

O que eu , socialista, não perdoo a este Governo e à sua direcção política

A propósito dos recentes acontecimentos de crise motivados pela Avaliação de Professores, devo começar por declarar interesses:
Sou professor do Ensino Público desde 76/77, sou também militante do Partido Socialista, tendo mesmo fundado a sua Secção do Barreiro quatro dias depois da Revolução de Abril e sou desde 1989, membro da Assembleia Municipal do Barreiro eleito nas listas do PS, tenho sido também um votante persistente no PS em todos os actos eleitorais, mesmo naqueles como as últimas Legislativas, em que tinha já uma “pontinha” de desconfiança, infelizmente confirmada, acerca do que iria passar-se a seguir num contexto de maioria absoluta que ajudei a concretizar e até me pareceu necessária, apesar de todas as minhas, a posteriori confirmadas, reservas.
Sou por opção e consciência, um militante indisciplinado ou seja, estou no Partido Socialista porque a sua tradição republicana e libertária, a sua cultura fundacional, abre espaço, ou eu pensava que abria, a que pessoas como eu se possam lá sentir como agora se diz “confortáveis”, como não sou nem nunca fui a “voz do dono” ou como muito bem diz um meu grande amigo de Vila Viçosa, “peão de brega” de ninguém. Honro, porém, os meus compromissos e portanto em tudo o que está estabelecido como essencial para a acção política do Partido nos órgãos em que o represento sou solidário com as decisões da maioria ou peço escusa de me pronunciar (Orçamentos, Grandes Opções, etc.), sem nunca hipotecar o meu sentido crítico e a minha ética pessoal e política.
Mesmo quando discordo, nunca o faço anonimamente e procuro fundamentar em argumentos as razões do posicionamento que assumo e nunca por critérios de mero seguidismo e autoridade, se este recorrente registo do “sim porque sim”, ou “não porque não” e porque o chefe de turno acha que sim ou acha que não, tivesse persistido, ainda "saberíamos" ser o Sol a girar em torno da Terra.
No entanto, respeito a autoridade legítima e o meu percurso pessoal é disso demonstrativo: fui aluno, estive no serviço militar e estou na profissão, sem nunca ter tido nenhum incidente de desrespeito para com as hierarquias legitimamente constituídas, e digo legitimamente constituídas, porque protagonizei um incidente político de certa gravidade em 1972, ainda estudante do Liceu D. João de Castro e fui sancionado pela ilegítima autoridade repressiva do Estado fascista e nisso tenho muita honra.
Após esta declaração de interesses passarei à substância do que enuncio em epígrafe, o que eu enquanto socialista, logo homem de esquerda com 52 anos e um passado que o atesta, não perdoo e não apenas nem principalmente, por ter sido directamente atingido pelos efeitos negativos da acção deste Governo que ajudei a eleger.
Não tenho, obviamente, a concepção "mercantilista" de que um Governo eleito deva fazer uma política agradável para os seus eleitores, é claro que o interesse geral e circunstâncias muitas vezes ditadas por conjunturas adversas poderão eventualmente falar mais alto que os cálculos de satisfação de todos os segmentos do eleitorado e bem sei que é impossível contentar toda a gente.
O que não é impossível é governar com verdade, o que não é impossível é assumir claramente a responsabilidade de ousar medidas verdadeiramente reformadoras, e não apenas “reformistas”, sem procurar lastrá-las na demagogia populista do circo do ressentimento social, explorando a mesquinhez típica da incompreensão e da hostilidade mútuas que sempre caracterizaram a nossa (e não apenas a nossa) sociedade, mas que entre nós decorre de uma relativa pequenez em recursos para distribuir, e de uma estrutura social já velha que sempre acarretou injustiças profundas (ainda hoje Portugal é um dos países mais injustos da União Europeia e da própria OCDE).
Concordo em absoluto que devem ser atacadas as razões estruturais do nosso deficit não apenas orçamental, mas de produtividade global dos nossos sistemas públicos e até do aparelho produtivo em geral, cujos indicadores face ao investimento realizado deixam muito a desejar, evidenciando graves distorções a exigir eficaz correcção.
Se isto é verdade para a Economia, também o é para os serviços públicos como a Educação, mas também a Saúde, a Justiça e os Sistemas Fiscal, Militar e de Segurança.
Vamos à Educação: esta tem sido palco de uma espécie de “teatro trágico” pelo menos desde a reforma Veiga Simão que data do início dos anos 70, sendo portanto anterior ao próprio 25 de Abril, e cujo desenvolvimento, mais sobressalto, menos sobressalto, não foi no fundamental, por este interrompido.
Houve uma fase inicial de enorme expansão do Sistema Educativo correspondendo às necessidades de desenvolvimento que a própria tecnocracia marcelista, que hoje continua bem representada no Poder, iniciou e que foi acompanhada e sustentada por uma expansão demográfica típica dos períodos históricos de alguma descompressão e prosperidade.
Essa situação obrigou à contratação e posterior integração nos Quadros de um enorme força de trabalho docente, a que acresce a multiplicação das disciplinas dos nossos muito extensos curricula, um pouco ao sabor de modas pedagógicas, de lobbies formativos e até de escape para o, agora incontornável, desemprego de licenciados.
Paulatinamente foi-se criando um “monstro” burocrático e organizacional, aliás, em concomitância com o que ocorreu nos outros subsistemas públicos (a Saúde, a Justiça, as Forças de Segurança, as Forças Armadas), sem que os ganhos de eficácia e de qualidade de serviço, na verdade correspondessem a esse sobredimensionamento.
Veio depois a quebra demográfica e o envelhecimento populacional típico dos chamados países ricos em que Portugal, sem o ser verdadeiramente, se integrou acumulando o pior de dois mundos: os défices típicos do subdesenvolvimento (iliteracias e carências estruturais várias) com os “malefícios” de uma pretensa e frágil “abundância” (consumismo exarcebado, alto nível de endividamento geral, excesso de motorização, erros alimentares crassos, excessos de vária ordem). E o Sistema Educativo foi sistematicamente abalado por “Reformas” e “Contra-Reformas” incoerentes, inconsistentes e incompletas (na verdade não passaram em geral de meros “remendos”e ensaios “experimentalistas”, mas muito mais para o lado do erro).
Este Governo do Partido de que sou militante e em quem votei, propôs-se intervir para alterar para melhor a situação, mas tem, desde o início, vindo a denunciar bastante, pelo menos, inabilidade política, quer quanto ao método, quer quanto à substância.
Quanto ao método, porque manda algum módico de ética republicana., demais a mais, num Governo apoiado no Parlamento por um Partido que se afirma de “esquerda” (“moderna” ou ”antiga", para o caso é secundário) que uma reforma qualquer que seja, conte com, senão a aceitação integral, pelo menos a compreensão da sua racionalidade intrínseca por parte daqueles que irão ser, pela lógica das coisas, os seus principais agentes, neste caso, os professores.
Manda também um mínimo de decência política que as medidas de fundo, o que nem sequer é o caso, sejam tomadas pelos decisores com independência de espírito, autonomia e sentido de responsabilidade e autoridade (no sentido de autoria), sem necessidade de recorrer a truques de baixa política demagógica e populista como a promoção de campanhas vexatórias de “assassínio” de carácter e o denegrir de imagem pública contra grupos profissionais como a que foi levada a cabo, escusada e contraproducentemente, por este Governo, contra os professores com evidente desonestidade política e intelectual. (É certo que só se pode exigir honestidade intelectual a quem tem “intelecto”, o que não tem sido evidente).
Este Executivo com um ME sem política autónoma, com uma equipa que aceitou o, nada dignificante, papel de “rosto” de um conjunto de directivas vindas de fora, manifestando evidente desconhecimento do meio, muitíssima falta de tacto, muita arrogância e prepotência, evidenciando uma total ausência de espírito democrático e um aventureirismo insensato mascarado de “coragem” com recurso constante a ameaças, insinuações e mentiras, reiterando declarações caluniosas como “ as Escolas são um caos organizativo” (a este propósito, não eram, agora mercê da tal “política educativa” aproximam-se perigosamente dessa situação) e “os professores mais antigos estão numa espécie de pré-reforma “ e outros chorrilhos afrontosos e semeadores da cizânia social como a de que “perdi os professores, mas ganhei os pais” e ameaças mais ou menos veladas, como perante a pergunta de jornalista sobre “o que irá acontecer aos professores dos últimos escalões que não concorrerem a Professor Titular”, a resposta foi: “ Por enquanto nada”, afrontas ao Provedor de Justiça, ao Procurador-Geral da República e aos Tribunais como aquando da afirmação de que os Açores não eram “território nacional”, alguma brejeirice indigna à mistura como quando a Sr.ª Ministra disse no “Prós E Prós” da RTP a uma professora de cabelo claro que “não era loura” e ainda recentemente ao acusar os professores de “chantagem” e um sem número de exemplos de cinismo, sarcasmo e truculência dos dois Secretários de Estado (Lemos e Pedreira), a utilização sistemática de um “pai” vitalício, o senhor Albino, que sendo um parceiro negocial como os outros, surge publicamente como que integrado no staff ministerial, destilando veneno e ódio sobre os professores e instigando publicamente a perseguição dos “hereges”, o “papismo” de sinistras personagens como a Directora da DREN (ex-sindicalista radical com o excesso de zelo típico dos recém-convertidos) em perseguições ad hominem a adversários políticos e falo do famigerado caso do dr. Charrua (ex-deputado do PSD), a visitas da PSP, desconhecendo-se a mando de quem, a sedes de Sindicatos nas vésperas de grandes manifestações, onde por duas vezes no mesmo ano mais de 100000 professores na primeira e mais de 120000 na segunda, três quartos da classe, certamente todos incompetentes, mandriões e calaceiros, desfilaram ao sábado em Lisboa.
Quanto à substância: Instaurando nas Escolas um inaudito clima de mal-estar, como nem nos tempos da outra senhora, pondo a funcionar a bufaria do costume e aliciando os Conselhos Executivos com os cargos de futuro Director, para que ainda assim sem coragem para assumir a nomeação directa, se recorre a um enviesamento legislativo muito “à PS”.
E como “entradas de leão” costumam originar “saídas de camaleão”, a cereja no cimo do bolo foi o tristemente célebre modelo de Avaliação de Desempenho Docente, que sendo um “monstro”burocrático e inútil, que não se destina a avaliar seriamente o que quer que seja, se a intenção fosse essa seria exequível e não comportaria “apenas” 190 (cento e noventa) descritores e que parece destinado a rebentar com toda e qualquer séria e necessária avaliação possível.
Por toda esta trapalhada que afogou na irrelevância as, aparentemente positivas, intenções iniciais: escola a tempo inteiro, Informática e Inglês para todos, generalização do uso dos meios informáticos, sendo dispensáveis as patéticas facécias de marketing ligadas à distribuição do “Magalhães, e até as aulas de substituição que se converteram em meras funções de custódia propangandística sem praticamente nenhum papel formativo.
O alargamento do horário dos docentes que ficam confinados a permanecer nas Escolas que não estão equipadas, nem sequer no espaço físico para isso, sem objectivamente estarem a fazer o que quer que seja de útil, tendo depois que consumir o seu tempo privado nas tarefas que são necessárias ( prepração de aulas, correcção de testes, registos de Direcção de Turma, etc.) a degradação das condições de trabalho nas escolas, cada vez com menos condições físicas e operacionais de funcionamento (degradação dos espaços, falta de pessoal auxiliar, penúria orçamental para despesas correntes) tudo gato escondido com o rabo de fora com a nuvem de fumo da “guerra” às “corporações”, quando as verdadeiras corporações provocam crises mundiais de dimensões imprevisíveis e é o dinheiro dos contribuintes que serve para tentar apagar o fogo que vigaristas encartados e pelos vistos, bem sucedidos, atearam.
Não, José Régio (José dos Reis Pereira), António Gedeão (Rómulo de Carvalho), Joel Serrão e Vergílio Ferreira que, entre tantos outros, foram professores do Ensino Secundário não se reveriam nesta “política educativa” e se calhar seriam avaliados com “Insuficiente” ou “Regular”neste modelo de (pseudo) avaliação.
Eu pela minha parte e considerando que depois das patéticas declarações de ontem, 20 de Novembro, em que a Sr.ª Ministra sempre tutelada pelo “sombra” Silva Pereira (ou pelo “eco” Santos Silva), veio com toda a “candura” reconhecer, aquilo que toda a gente menos os apparatchiks do costume e o set propagandístico da alarvidade (o “bichano”, porque filho do “tareco”, Sousa Tavares, Emídio “The Black and Decker Master” Rangel, Vital ”The Renegade” Moreira e tutti quanti) desconheciam, que o processo tem “erros teóricos de concepção “ e “extremas dificuldades de ser posto em prática” que, como ia dizendo, ontem acabou por reconhecer a própria Professora Maria de Lurdes Rodrigues que com certeza, ainda não avaliou bem o grau de anomia e de entropia que ela e sua equipa foram capazes de introduzir no Sistema e que neste momento constitui um “cadáver” político, entenda-se, adiado.
Mas como diz um colega e amigo arquitecto:
- “Há duas matérias em que toda a gente é “especialista”: Educação e Urbanismo, isto porque mais ou menos toda a gente andou na escola e mais ou menos toda a gente, mora numa casa”!
Ora nem mais!!!

Post-Scriptum:
1 - Adorei ver a “ensaboadela” que o “jota” style Marcos Perestrelo (ou Perestello, não sei, nem particularmente me interessa) levou na RTP1 do Mário Nogueira, mesmo olhando para a cábula e tartamudeando o “argumentário” levou um grande “bailarico”, é caso para dizer: “metem-se com homens”!!!
2 - Estão a abandonar o Sistema cerca de 12 professores por dia, por reforma antecipada mesmo com penalizações pecuniárias que chegam aos 40%, se este era uns dos objectivos do Governo, então parabéns, na "mouche" !!! É claro que são os mais experientes e, em muitos casos, os melhores que estão a "abandonar o barco", mas que importância tem isso para a concepção que esta "seita" tem de Educação. Para fazer o que pretendem que seja feito, isto é perto de nada e mais uns "cocós", qualquer um serve, sem refilar e a ganhar muito menos.
3 - O novo ECD com o "concurso" para Professor Titular foi das maiores "moscambilhas " que vi na vida (e não falo por despeito, pois fui provido e sou Professor Titular), mas foi uma lotaria atrabiliária para o que contaram apenas os últimos 7 anosde carreira, daí que em muitos casos, houve mais de 30 que, como por magia, se eclipsaram, se calhar foram "engolidos" por algum "buraco negro". Teria sido mais honesto abrirem verdadeiros concursos curriculares para novas categorias com designações decentes e republicanas ( que não cheirem a "Fado do Embuçado" - "de uma vez que eu fui cantar ao salão de um Titular"), tais como e por exemplo : Professor Coordenador e Professor Supervisor (mas isso dava muito trabalho).
4 - Na facécia de"auto-crítica" pública da Srª. Ministra, ela "deixou cair"as "Aulas Assistidas", afinal o mais fundamental e o elemento por excelência de uma qualquer séria Avaliação de Desempenho Docente e como em Modelos de Formação anteriores se caíu no mesmo erro (mais concretamente na mesma "preguiça") e foram dispensados da assistência a aulas professores com 6 ou mais anos de serviço, continuaremos a ter professores que durante toda a carreira nunca tiveram uma aula supervisionada, prova provada de que o "monstro" quer apenas e só "papel" e mais "papel" e nada mais do que "papel"!!!



António José Ferreira (Professor, Socialista e tudo)

14 comentários:

Anti PS Neoliberal disse...

Pois é TóZé mas o que passou para a opinião publica é que os professores não querem ser avaliados.

Anti PS Neoliberal disse...

Arranja o Post por que parte do texto sai em duplicado.

imank disse...

Obrigado, já arranjei!
Um abraço;
Tozé

Anti PS Neoliberal disse...

Confesso que ontem quando comentei fiz uma leitura enviesada do post, hoje com mais calma li a totalidade e reli algumas partes, isto tudo para te dizer novamente que aquilo que passou para alguns sectores da opinião publica foi que "os professores afinal não querem é ser avaliados a ministra já recuou, ora bolas, também não pode dar tudo" este e outros argumentos eram ontem veiculados nos dois cafés onde eu ainda faço tertúlia, lá ia eu dizendo que não era bem assim, os meus argumentos venceram mas não convenceram.

Outra coisa, se à tipo com quem eu embirro solenemente é com esse tal de Marco Perestrello mas também incluo na mesma bitola o Nuno Melo, o ar de convencidos, de new have, todos lavadinhos e aperaltados... aquilo serão homens? driblam argumentos como quem dribla espadas, mas sem olharem a consequências, dizem e desdizem-se são iguais no trato na fala nos argumentos, as semelhanças são tamanhas e gritantes que eu diria que ali à coisa.

Um abraço do SEMPRE

Anti PS Neoliberal

Anônimo disse...

Caro António José,

Gostei. Só acho que ainda estás a ser muito simpático e meiguinho. Eu, que até nem sou docente do básico e secundário, também não esqueço nem perdoo algumas, entre elas, aquela do Sócrates sobre os "candidatos a professores".

Brás

a Arrábida aqui tão perto disse...

Olá, TóZé
tens toda a razão ao demonstrares a tua indignação.Apesar de termos um ditador no poder, assessorado por lavadinhos com Audi/Mercedes carrinha,convencidos que o Sol nasce porque eles estão existem, tenho esperança de ajguma mudancinha. Considero que ao termos a lucidez e a experiência, do nosso lado, arma que eles não têm,a podemos usar de modo incisivo, rápido e com coragem(inteligência).
Apoio a tua revolta, usa-a para incomodar os lavadinhos.
Beijs,
Ana Ramalho

João Narciso disse...

Caro Tozé,

Antes de mais, convém perceber que a revolta dos professores não é de agora e tem que ver com muitos mais factores do que a Avaliação de Desempenho. De facto, há muito que se sentia entre os professores um mal-estar latente. Note-se que foi com este Ministério da Educação que, entre outras medidas, os professores passaram a ter um horário na escola mais alargado, as progressões na carreira congeladas, a idade da reforma adiada para os 65 anos, aulas de apoio e de substituição por sua conta e um regime de faltas e de interrupções lectivas muito mais apertado. Tudo isto medidas que, independentemente da sua justiça e urgência, infligiram aos professores perdas nos seus direitos outrora adquiridos.

Claro que, por si só, estas medidas não eram justificativas de grandes contestações, mas somadas, uma após outra, foram mais do que suficientes para que a classe docente se sentisse vitimizada e perdesse a confiança no Ministério de Educação. À custa disso, os sindicatos reforçaram o seu papel junto da classe docente e tornaram-se os principais, senão únicos, fazedores de opinião credível entre os professores, adoptando uma postura de clara oposição a tudo o que emanava do gabinete da Ministra.

Os sindicatos quando pegaram na questão da Avaliação do Desempenho dos Professores fizeram-no com óbvia má fé, fazendo crer que o que aí vinha iria tornar a vida dos professores num inferno, impossibilitando que qualquer professor subisse na carreira. Os professores, completamente manietados e feridos, nem se deram ao trabalho de dar o benefício da dúvida ao Ministério da Educação em algo que, não sendo perfeito, é mais do que necessário e justo fazer. Afinal, qual seria o professor que aceitaria de bom grado, de um dia para outro, o incómodo da diferenciação e a preocupação de prestar contas pelo trabalho realizado ao longo do ano lectivo, ainda por cima com implicações na progressão na carreira? Certamente muito poucos.

Para existir qualidade no ensino tem de haver uma boa avaliação dos seus intervenientes. É assim com os alunos. Deve ser assim com os professores. A qualidade tem de ser premiada e tem de haver uma clara discriminação entre os bons e os maus professores (e por isso, na falta de melhor alternativa, tem de haver quotas). Até há bem pouco tempo, a profissão de professor proporcionava inúmeras situações de não ser exercida. Depois de entrar na carreira era um descanso. Para alguns, a segurança de um emprego para a vida e a certeza de uma promoção automática, eram as únicas coisas que os prendiam à profissão. Muitos caíram na rotina, no comodismo e no facilitismo que a carreira oferecia. Até os bons professores se desmotivaram e acabaram por entrar nesta cultura descentrada do seu objectivo principal: o sucesso dos alunos.

Sejamos claros, a reforma em curso na educação é difícil, com óbvios custos políticos, e envolve mudanças profundas na cultura das nossas escolas que, sem margem de dúvida, afectam os interesses e expectativas dos professores. Contudo, são reformas imperativas a bem do país, que só não foram feitas há muitos anos por falta de coragem política dos governos anteriores. Porque a escola pública existe por causa dos alunos, é neles que devemos centrar as nossas atenções. Por isso que, para bem dos alunos e dos bons professores, é urgente mudar. A escola precisa de voltar a ser credível e isso só é compatível com uma cultura de qualidade e exigência para todos, inclusive para os professores.

P.S.

1. Os sindicatos têm-se servido da insatisfação dos professores para, com sucesso, construírem um clima de receio e boicote nas escolas baseado em argumentos enganosos, que os professores acolhem sem espírito crítico nenhum (por exemplo, muitos professores estão convencidos que nunca mais vão progredir na carreira quando, em boa verdade, apenas uma avaliação negativa o impede; Muitos professores estão também convencidos que os avaliadores partilham das mesmas quotas dos avaliados, quando está regulamentado que existem quotas pr´prias para avaliadores e avaliados).

2. Os números impressionantes das manifestações assentam num conjunto de motivos que v para além da história da avaliação docente - o bode expiatório dos professores. Contudo a maior parte dos professores não quer esta nem nenhuma avaliação. Aliás, quer a que havia, porque é a única que garante que todos cheguem, sem esforço, sem incómodo e sem diferenciação, ao topo da carreira (ou então querem uma que não existe, que vai dar ao mesmo).

3. Apesar deste modelo de avaliação não ser perfeito e carecer de muitas melhorias é o modelo que, entre todos os disponíveis, melhor serve o interesse da escola e dos professores. Imagine-se, por exemplo, uma avaliação externa e o pandemónio que não seria nas escolas (gostaria de ver os professores a serem avaliados por um inspector que fosse à escola uma ou duas vezes por ano e que avaliasse os professores de áreas tão diferentes como Educação Visual, Alemão ou Matemática). Os professores têm o dever de experimentar este modelo e, de boa fé, contribuir decisivamente para a sua optimização e operacionalidade. Era nisso que deveriam investir o seu tempo e empenho.

4. Muitos professores queixam-se da burocracia do processo de avaliação quando são os próprios, em cada escola, que definem quais os papéis que é necessário preencher e produzir. Ou seja, sempre que se dá à escolas poder decisório para fazer qualquer coisa de importante, invariavelmente, tem de haver um despacho para ensinar aos professores o que fazer exactamente, porque estes só complicam e burocratizam a coisa.

5. Quando alguns professores dizem, os avaliadores em particular, que estão sem tempo para preparar as suas aulas, não dizem a verdade. Os professores avaliadores - que são todos do 8º, 9º ou 10º escalão – com 5 a 8 horas semanais para avaliar os 6 ou 7 professores a seu cargo (ou seja por cada ano lectivo têm no seu horário, pelo menos 250 horas para dedicar à avaliação). É só fazer as contas. Note-se, no entanto, que neste início de processo é normal que se perca muito mais tempo que o disponível, afinal só agora é que as escolas estão a construir os instrumentos de avaliação.

6. Quando se diz que este processo está a afectar o normal funcionamento das aulas e a prejudicar a qualidade do ensino também não se fala a verdade. Aliás, desde que se sabe que a assiduidade é um factor de avaliação, poucos são os professores a faltar. Mais, ao contrário do que dizem, nunca como agora houve tanta preocupação com os alunos, com as suas aprendizagens e com o seu sucesso.

7. Os professores não querem hierarquias nem responsabilidades que os diferenciem, isto é, querem ser todos iguais e não aceitam a categoria de professor titular. Mas já não se incomodavam tanto quando alguns, sem nenhum mérito além da antiguidade, chegavam ao topo da carreira ganhando o dobro (2200 euros) com metade do trabalho (12 horas lectivas semanais). Afinal, mais cedo ou mais tarde, todos lá chegariam.

8. Aliás, a criação da categoria de professor titular veio confirmar que a avaliação que havia não valia nada, por isso é que não foi possível escolher os melhores, e que é urgente implementar uma avaliação que, de facto, diferencie e premei aqueles que o merecem.

João Narciso
Professor de Matemática e socialista (não filiado)(e também, seu colega, o ano passado, na ESSA).

imank disse...

Caro João Narciso:
Ainda bem que comentas o meu post e aleluia , até que enfim que há alguém não anónimo que "discorda" da minha posição.
Eu defendo a Avaliação de Desempenho e sempre a defendi.
A questão é que esta "avaliação" não avalia o desempenho efectivo do professor , mas um simulacro burocrático (portefólios e assim) que não se destinam a avaliar professores,mas apenas a controlá-los e a mostrar "quem manda".
Se assim não fosse o ME não teria deixado cair o único real instrumento de Avaliação de Professores, a observação de aulas!
Os referidos 2200 Euros, são na verdade, apenas 2000 e vais dizer-me que quadro empresarial ou mesmo público ganha isso, sem alcavalas, ao fim de 30 anos de profissão?! Quanto ás "12 horas" de trabalho, saberás que não é verdade, pois eu e muitos como eu ,que agora tendem a cumprir um fictício horário de 35 horas de aprisionamento em Escolas que não têm condições de trabalho, nem sequer foram concebidas em espaço físico e dotadas em equipamento para tanto tempo de permanência simultânea, sempre demos o nosso tempo e esforço à Escola e aos Alunos sem limites.
O ano passado por exemplo, tu que és e eu sei que és, um excelente professor, foste prejudicado na tua avaliação (Bom a todos) pela estupidez e cegueira política deste Governo do Partido com quem tu simpatizas e eu integro.
Tudo se faria de outro modo , sem tumultos e sem crispação,uma pura questão de "tacto".
Voltarei ao diálogo contigo , agora tenho que interromper, é que como sabes , sou Coordenador do Departamento de Ciências Sociais e Humanas da ESSA e hoje temos uma Reunião que estou a preparar em que uma altíssima percentagem é "palha", e, podes crer, que não fui eu que a "inventei".
Até breve, um forte abraço:
Tozé

imank disse...

Caro João Narciso:
Agora que já dirigi a Reunião que decorreu, como deves calcular, num clima de assinalável crispação e onde se abordaram coisas utílíssimas e proveitosas como o PEE,o PAA, o PCE e o RI e outrs "chachadas" inutéis que muito poucos se dão ao trabalho sequer de ler e que como tu sabes não foram inventadas pelos professores mas por um Sistema Educativo que é e tende a ser cada vez mais, absurda e estupidamente burocrático, retomo a troca de impressões contigo.
Os teus argumentos plasmam de uma forma um pouco menos canhestra os argumentos oficiais repetidos até à exaustão pelo ME mas que não passam a ser aceitáveis por força de serem repetidos.
Como "quem não se sente, não é filho de boa gente" é natural que os professores se ressintam de tanta tropelia e tanto abuso em tão pouco tempo. Tu próprio e eu assisti, pois estava no Gabinete do CE, reagiste com veemência a algo que consideraste abusivo logo em relação ao horário que te foi distribuído. Como vês. não estamos propriamente, no "melhor dos mundos".
Os professores que afirmas terem, no topo de carreira ,apenas 12 horas lectivas, andaram, noutros tempos, com a "casa às costas", a dormir em quartos alugados e a comer "meias-doses", mas nessa altura ainda tu ainda eras pequenino.
E eram "horas lectivas", então e as outras não contam?
Será que um professor para leccionar não precisa de fazer mais nada?! Será só chegar lá e "despejar o saco"?
Parece que partilhas de uma visão muito "tecnocêntrica" do trabalho do professor, mas sabes, eu sou de ums área em que as rotinas e os "gadgets" pouco ajudam e a palavra dita e escrita ainda é e sempre será o melhor veículo de estruturação do pensamento, mas os os objectivos desta polítca (des)educativa são mais a sua desestruturação.
Aliás, corremos o risco de estar a designar de igual forma coisas profundamente diferentes, termos como "saber","informação",
"competência", "bom desempenho" e "qualidade de serviço" por exemplo não querem dizer para todos a mesma coisa e como julgo que sabes, o Poder tende a ver "anjos cor de rosa" onde todos os outros que não, obviamente, os seus apaniguados, veêm tudo menos isso.
Não é também verdade que os Sindicatos liderem o processo de contestação dos professores à política, que reputo de desastrosa, deste Governo.
Eles têm-se limitado a "cavalgar a onda" e a ir a reboque e se rasgaram o "memorando", foi por pressão dos professores.
Aliás, sejamos honestos, o ME também não cumpriu a sua parte porque este ME não tem qualquer autonomia política, é apenas uma mera correia de transmissão de medidas que foram "desenhadas" de fora e é responsável por uma campanha de insultos que até tu pessoa inteligente, mas com pouca experiência de vida , reproduzes.
Se calhar foi preciso teres chegado à profissão para alguém ter começado a trabalhar.
Essa atitude reflecte o "veneno", felizmente minoritariamente bebido, que o Governo está a lançar sobre os professores seguindo, de uma forma assaz inábil, o velho aforismo "dividir para reinar". Felizmente que poucos, muito poucos, se deixam iludir!
Também não é verdade que os Professores Titulares tenham toda a componente não lectiva afecta à Avaliação de Desempenho, só se for na tua Escola, diz-me por favor, se há vagas para eu concorrer para lá.
E vamos lá ao cerne da questão : não olhes para o que as Escolas fizeram, olha só para as fichas que estão no Diário da República e tu que até és professor de Matemática faz as contas, multiplidca os Domínios pelos Parâmetros e estes pelos níveis possíveis, chegarás ao número de 190, 190 Descritores!?
Conheces algum sistema de Avaliação do que quer que seja , parecido?
Para além dos Sistemas de Avaliação deverem avaliar o normal desempenho da organização e do profissional, pois este, como tu sabes irá, se deixarmos, avaliar uma ficção produzida expressamente para o "monstro" e que nada terá que ver com o real e normal desempenho!
Sabes que mais, deixemo-nos de tretas ou em inglês, de "bullshit".

São disse...

Tozé, sinceros parabéns pela clareza e pela coragem desta tua análise.

Eu também escrevi algo sobre o tema, mas sem a profundidade que atingiste aqui.

Um abraço, a partilhar com a Ana.

Anônimo disse...

Caro António José,

Depois de ler as impressões que trocas com João Narciso, continuo a achar que andas muito meiguinho e simpático.

Há atrocidades que muita boa gente desconhece. Como bem sabes, não sou docente do Ensino Básico e Secundário (se fosse, depois de tanta maldade do sistema, o "c" já teria caído e como muitos, seria doente do ensino básico e secundário, provavelmente como muitos, em tratamento psiquiátrico) o que não me impede de conhecer as realidades bem de perto.

Pessoal mais jovem desconhece o que é isso de andar com a casa às costas, o que foi isso de ser chamado à profissionalização e outras coisas do género.

Para elucidar os mais distraídos, publiquei recentemente no meu blog uma queixa que em tempos enviei à Provedoria de Justiça (vd. http://casa.telecom.pt/PTResidencial2/Tabs/MyPTPublico/Plano_Precos/precario/comunicacoes.htm), a qual mereceu um resposta que confirma que «o Poder tende a ver "anjos cor de rosa" onde todos os outros que não, obviamente, os seus apaniguados, veêm tudo menos isso».

Agora que já desabafei, volto para o meu trabalho de construir o Powerpoint de apresentação e defesa da minha tese de doutoramento sobre... Pois! Nem mais, nem menos, avaliação de desempenho e algumas coisas mais na AP portuguesa: Umas "bullshit" incomodativas para o tal poder que tende a ver os tais "anjos cor de rosa".

Abraço,
Brás

Anônimo disse...

Rectificação: O texto está em http://contributos.blogspot.com/2008/11/docentes-um-estado-com-dois-pesos-e.html

imank disse...

Brás:
Diz-me o local, o dia e a hora da defesa da tua Tese de Doutouramento e eu , se concordares, claro, e fôr em dia que possa, terei todo o gosto em assistir.
Um abraço:
Tozé

Anônimo disse...

Caro António José,

Terei todo o gosto e seria um grande prazer. Mas penso, a exemplo do ocorrido a outros dois colegas, vou ter uma sala quase sem assistência portuguesa. É que o local é em Sevilha.

UNIVERSIDAD DE SEVILLA
FACULTAD DE CIENCIAS ECONÓMICAS Y EMPRESARIALES
Dirección:
AVDA. RAMÓN Y CAJAL, 1
SEVILLA - 41018

Data e hora só sei garantidamente com 15 dias de antecedência. O processo de constituição do Júri (Tribunal Doctoral) é moroso e um pouco complicado: Primeiro elaboram uma lista dos especialistas na matéria, depois enviam convites e esperam a resposta de aceitação. Existindo o número de membros necessários, é ainda necessário conciliar as disponibilidades de todos membros efectivos e suplentes do Tribunal Doctoral.

No entretanto... como todos os meus antecessores, resta-me ter tudo preparado para a defesa e roer as unhas.

Se tudo correr bem, será marcada a defesa lá para meados de Fevereiro, se correr mal como ocorreu com o meu último colega, cuja defesa estava prevista para Fevereiro, será lá para finais de Maio.

Que bom seria ter lá o calor de uns quantos amigos portugueses. Mas são 436 km de ida e outros 436 km de volta, normalmente numa quarta ou quinta-feira.

Assim que saiba data e hora concreta, não deixarei de comunicar. Quantos mais poderem ir, melhor!