quinta-feira, 30 de setembro de 2010

Um País de Kennedys


"Ask not what your country can do for you, ask what you can do for your country."

John F. Kennedy


Esta célebre frase, tornada cliché por uso impróprio, tem vindo a servir de mote ao assalto do século, ainda por cima à mão armada (a "mão" do poder do Estado) que está a ser perpetrado sobre a vítima do costume, a classe média assalariada, sob o pretexto: "os ricos que paguem a crise". Ser "rico" em Portugal não é exibir fortuna por meios nunca justificados, basta auferir um vencimento (não propriamente um rendimento) bruto igual ou superior a 1500 Euros.
Ora, esta frase dita, ou simplesmente insinuada, por membros deste Governo, a começar pelo "chefe" (suspeito que apenas putativo) e a acabar no Secretário de Estado do Orçamento, Emanuel dos Santos, (nome adequadíssimo para quem nos anda a "bandarilhar"), certamente que já não engana ninguém e é prova eloquente de como em Portugal a mentira e a má fé permitem ganhar eleições, prometendo exactamente o contrário daquilo que se acaba por fazer (aumentar impostos, reduzir salários, cortar nas prestações sociais).
Eloquentemente o dito Emanuel dos Santos utilizou uma espécie de falácia "aritmética" quando confirmou aos jornalistas que lhe perguntaram "se estas medidas seriam, ou não, transitórias", os piores receios dos, ainda atónitos, funcionários públicos ao dizer que as "alterações salariais" como cinicamente lhes chamou, "podem ter dois sentidos, positivo ou negativo, pois quando há aumentos ninguém pergunta por quanto tempo vão durar"!
Perante o inédito histórico, nem o Professor Pangloss se lembraria de aduzir um argumento de tão "santa candura".
Para tais "émulos" de Kennedy só a resposta do velho Lloyd Bentsen, candidato a vice-presidente dos Estados Unidos no ticket de Michael Dukakis, quando o peralta Dan Quayle, que veio a ser vice-presidente de Bush pai, insinuou que a sua semelhança com JFK era mais do que vagamente física:
- "Senator you`re no Kennedy!"

sábado, 25 de setembro de 2010

Chungaria


O poder está neste momento e em muitos países nas mãos de políticos chungas. E por cá não fugimos à regra, uma das desgraças de uma certa "democracia" é a "democratização" da imbecilidade e da grosseria. Tivemos agora um exemplo de chantagem e contra-chantagem entre o Primeiro-ministro e o líder do maior partido da oposição, acusando-se mutuamente de terem mentido e o público fica sem perceber quem estará a mentir e claro, inclina-se para que sejam os dois.
Medeiros Ferreira ex-MNE, e doutra cepa, avisa que a falta de educação em política se materializa, por exemplo, em encontros a dois para negociar, algo que nunca deveria acontecer. Os partidos são entidades colectivas cujo fito é gerir a colectividade e manda um módico de bom senso e formação republicana (no sentido original de res publica), que este tipo de encontros se realize entre delegações.
É que a diplomacia foi inventada para envolver em "veludo" coisas muito duras e com muitas arestas, mas esse envólucro dignifica-as e dignifica as relações entre as pessoas.
Não será por acaso que mesmo a hipocrisia seja o tributo que o vício paga à virtude.
Como estamos entregues a parvenus, que não raramente roçam o burgesso, com óbvia falta de chá e que cultivam uma despudorada forma de arrivismo "solipsista", passa a ser vulgar que encarem o tête-à-tête como modo "normal" de fazer política.
Depois não podem admirar-se, nem fazer-se escandalizados, quando um deles ouvir o outro a dizer que só tornará a falar-lhe em frente de testemunhas.
Como dizia a minha avó:
- "Escusavas de ouvir isto!"
É chunga, é muito chunga!!!

quinta-feira, 23 de setembro de 2010

Santo Agostinho


"Senhor, fazei-me casto, mas não agora!"
Santo Agostinho


Não é apenas dos altos exemplos da lusa giesta que se alimenta a "nomenclatura" nacional, também dos mais elevados contributos da História do Pensamento costuma colher a exemplaridade.
Desta vez foi a Santo Agostinho que a Administração das "Águas de Portugal", pela voz do responsável pela "Área Social" da empresa, foi inspirar-se para declarar que, apesar dos 400(?!) automóveis topo de gama que estão atribuídos para uso de serviço e também pessoal, aos seus quadros, sem contar com os veículos de intervenção (carrinhas dos piquetes, etc.), irá agora começar a reduzir essas despesas, o que terá efeitos orçamentais já no próximo ano.
Afinal, este alto responsável deixa a solene promessa de contenção na frota para uso privado dos quadros de uma empresa, que apesar de ter mais administradores do que a Ilha do Corvo tem habitantes, ter congelados os salários do pessoal de base (aqueles que põem a água em casa das pessoas) e de ter sido por várias vezes apontada pelo Tribunal de Contas como estando em "frágil situação financeira", só este ano comprou mais 34 luxuosos "popós" para a rapaziada da Administração.
Ditosa Pátria que tais fihos tem!

Vernáculo


Os media, talvez por falta de assunto, abriram esta manhã com o magno problema dos "livros escolares que ensinam palavrões". Explicada a "caixa" no desenvolvimento da notícia, percebe-se que se trata de dicionários, alguns de respeitáveis e consagradas editoras, que contêm termos e expressões vernaculares.
Este "problema" é antigo, já no meu tempo de Liceu (há mais de quarenta anos e ainda com Salazar em funções) o pessoal, mesmo os que se estavam "borrifando" para a Literatura, adorava as aulas de Português em que se liam os Autos de Gil Vicente, por causa do vernáculo.
Oficialmente os "palavrões" estavam interditos, mas naquele caso não havia volta a dar, eles estavam lá no texto e era delicioso lermos em voz alta para toda a turma, ou melhor ainda, ouvirmos o engravatado professor ler para nós. Pelo menos que eu tivesse dado conta, não passou então pela cabeça de nenhuma "boa alma", cheia de públicos acessos de pudor, contestá-lo.
Sei que, também há uns anos, se bem me lembro no princípio da década de 90, houve no Alentejo um julgamento de uma figura castiça local, que estando no cante com os amigos, parece que já bem bebidos e altas horas, na Praça central da vila, perante a intervenção da GNR chamou a um sargento da referida força "filho da puta". O sargento, considerando-se desrespeitado, apresentou queixa ao Tribunal, houve um processo sumário com audiência no dia seguinte e o juiz aceitou como boa a tese do advogado do arguido (devia ser tudo malta da "corda") de que a intenção deste não tinha sido ofender o agente da autoridade, mas apenas, muito meritoriamente, utilizar no diálogo que estabeleceram um Português rico e de lei, o "vernáculo vicentino" e decidiu pela absolvição do cantador.
Ora, descontando o anedótico, se essas almas sensíveis estão assim tão preocupadas com o uso de "palavrões", não se fiquem pelos dicionários, entrem nas Escolas e não ouvirão, praticamente, uma frase que não acabe em "alho".

quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Estudos de Improdutividade


Um dos mais divulgados mitos acerca dos portugueses é o do "desenrasca". Seríamos então especialistas em fazer tudo de "improviso" ou melhor, "à balda" e como "a necessidade aguça o engenho", as nossas soluções instantâneas para problemas complexos seriam autênticos "ovos de Colombo". Porém se observarmos com atenção o comportamento típico do português comum, em todo o espectro social, veremos que não é assim tão pouco racional e falho de sistematicidade.
Na verdade desenvolvem-se aturados, ainda que informais, estudos de improdutividade estratégica, conceito que não tardará a ser acolhido nas melhores escolas de economia e gestão do planeta. A improdutividade estratégica consiste em demorar o máximo tempo possível para produzir o mínimo e verifica-se na mais banal das intervenções públicas e em todos os sectores da sociedade portuguesa, desde os tribunais às autarquias, passando pelas escolas e pelos hospitais, não poupando sequer a endeusada "iniciativa privada", vejam-se os bancos e as seguradoras, por exemplo.
Ainda esta manhã assisti, em tempo real e ao vivo, a uma demonstração prática dessa nossa tão característica competência, como agora se diz. Em frente à minha casa há um olival (não, não moro no campo, é em pleno centro do Barreiro), transformado em "baldio" e que serve, entre outras coisas (vazadouro de entulho de obras partculares, despejo de lixos vários), de bolsa de estacionamento, ia dizer gratuito, mas de repente lembrei-me dos préstimos dos T.P.A. (Técnicos de Parqueamento Automóvel) que têm que ser devidamente compensados com a "moedinha" da tarifa (afinal há que estimular o empreendedorismo). Somos um povo muito pragmático, se o olival estivesse arranjado, enquadrado num espaço verde, com zona de estacionamento marcada, onde é que a malta ia vazar os entulhos e desfazer-se das tralhas?
Ora, à entrada desse espaço estava, há mais de um ano, a abrir-se uma cratera que ameaçava a integridade dos veículos que ali estacionam, pois os serviços municipais usando de elevado sentido de planeamento, não se precipitaram com intervenções precoces, nada disso. Deixaram o buraco ganhar dimensões apreciáveis e ao fim de um ano mandaram tapá-lo. Calhou esta manhã e não se pense que foi "Sol de pouca dura", não senhor, consumiu exactamente o período de trabalho matutino da brigada que veio proceder à obra e aqui percebemos o apurado sentido de gestão das chefias portuguesas, se tivessem vindo mais cedo e apanhado o buraco numa fase insignificante como iriam justificar meio-dia de intervenção? Temos que ser realistas.
Veio então uma retroescavadora, mais meia-dúzia de homens e claro, um encarregado, chegaram por volta das nove, que entram às oito e o Parque de Máquinas ainda fica a um bom quilómetro do local e por volta do meio-dia deram por terminada a obra, que consistiu em tapar com terra um buraco, pois a hora do almoço é ao meio-dia e meia.
E ainda dizem que não sabemos planificar e que fazemos tudo ao calhas!
Fazer o máximo para produzir o mínimo dá imenso trabalho. Para lá chegar é preciso "queimar muito as pestanas" e nem todos os povos demonstram essa capacidade inata.
Quem não inventa "ovos de Colombo", tem que "desatar nós górdios".
Como dizia o outro:
- "É a vida!"

domingo, 19 de setembro de 2010

Deuladeu


Sete anos de pastor Jacob servia
Labão, pai de Raquel, serrana bela;
Mas não servia ao pai, servia a ela,
E a ela só por prémio pretendia.

Os dias, na esperança de um só dia,
Passava, contentando-se com vê-la;
Porém o pai, usando de cautela,
Em lugar de Raquel lhe dava Lia.

Luís Vaz de Camões

O dr. Gilberto Madaíl continua apostado na prosecução dos altos exemplos de devoção, abnegação e sacrifício patriótico da giesta dos nossos "egrégios avós"; desta feita foi da grande Deuladeu Martins que colheu o nobre exemplo.
No reinado de El-Rei D. Fernando e estando a praça-forte de Monção sitiada por um exército castelhano, a castelã Deuladeu Martins comandou, na ausência do marido, o capitão-mor Vasco Gomes de Abreu que andava em peleja por outras paragens, a resistência ao invasor.
Estando a vila quase a perecer de fome e na iminência de ter de render-se, a heróica Deuladeu teve o rasgo de génio que lhe permitiu fazer o maior e mais vitorioso bluff da lusa história. Com a última farinha que restava, mandou cozer uns poucos pães e brandindo-os das ameias do castelo, atirou-os às tropas sitiantes que perante este gesto de fartura e também acossadas pela fome e outras moléstias de campanha se retiraram.
Agora sabemos que animado por este espírito de serviço pátrio o dr. Madaíl afirmou ter tentado contratar o valido Mourinho para guia das nossas hostes e que o Real Madrid terá recusado. Essa tentativa é, porém, desmentida por Valdano, intendente-mor do Real, que afirma que o Presidente da FPF deu o acto por frustrado sem sequer o ter proposto a D. Florentino Perez, real potentado do Merengue. Sem dúvida um acto de bluff patriótico que terá servido sobretudo para lhe retocar a imagem e levantar a moral das hostes, permitindo o golpe de asa, também inspirado pelo estro do vate Luís Vaz de Camões - de passar da Idade Média à Era Espacial, sondando o comandante Paulo Bento que como todos sabemos é um veterano do "Mar da Tranquilidade".

sexta-feira, 17 de setembro de 2010

O Síndrome de Egas Moniz



Marx avisou que a história se repete, a primeira vez como tragédia, a segunda como farsa. Não será assim de estranhar que o dr. Gilberto Madaíl, presidente da FPF, tenha manifestado o Síndrome de Egas Moniz e também ele tenha ido a Castela de "corda ao pescoço" rogar desta feita aos reis da bola madrilenos, que nos dispensem o valido Mourinho, o único que pode salvar as hostes lusas nos próximos prélios com os vikings, depois de dois desastres seguidos e mais umas partes baixas que levaram à destituição do condestável Queirós.
Se é golpe de teatro, coelho da cartola, fuga para a frente ou, como se diz na nova língua "perteguesa", "ambas as duas", não sei, mas é de mestre.
O homem pode ter muitos defeitos, mas que não é parvo, não é não senhora!

quarta-feira, 15 de setembro de 2010

Confissões



"Deus morreu, Marx também e eu próprio não me sinto lá muito bem"

"Confissão" mural do Maio de 68





Estas "Confissões" não sendo as de Santo Agostinho, nem as de Jean-Jacques Rousseau, não deixam de ser significativas. Francisco Assis, líder parlamentar do PS, ao desmentir, ontem no "Frente-a-Frente" da SIC - Notícias, a insinuação de Morais Sarmento de que o Partido Socialista continuava a ser "marxista" e por isso obstinava-se a não querer nenhum tipo de revisão constitucional, respondeu com uma assertividade fulminante, deixando o antigo boxeur num autêntico estado de knock out argumentativo:
- "Então se acha que isso é verdade e sendo o actual Governo do Partido Socialista, achará certamente que é um Governo marxista, olhe que não me parece!".
De facto, nem a ele, nem a ninguém!
Só me ocorre outra "confissão" mural soixante-huitard: "Je suis marxiste, tendence Groucho"!
Um tiro num porta-aviões. Xeque mate!

quinta-feira, 9 de setembro de 2010

"Manchester England, England"


Não há dúvida que o professor Carlos Queiroz é um sujeito aprumado, ao ponto de não perder a compostura mesmo quando parece ter perdido as estribeiras. Terão certamente reparado no preciosismo de virar o casaco do avesso em plena arruaça, antes de o atirar ao chão.
É certo que nos tem brindado com actos que não suspeitávamos possíveis como a agressão ao jornalista Jorge Batista ou a alusão às partes pudendas da progenitora do dr. Luís Horta (médico-chefe da Autoridade Anti-Dopagem), mas tudo isso poderá ser pelo menos atenuado se considerarmos o carácter auto-sacrificial de quem aceita cargos como o de seleccionador nacional de futebol num mundo em transe e num país em que a crise é particularmente aguda ao ponto de agravar o crónico problema da má relação de certos políticos com a verdade. Quem se lembrou de "levar a democracia" ao Iraque quando o Saddam Hussein era o "nosso" (dos Estados Unidos, claro) filho da puta? Quem se lembrou da "equidade", invocada para baixar salários e suprimir benefícios, quando havia dinheiro?
O caso Carlos Queiroz assume o carácter "sacripântico" de quem precisa de um pretexto para correr com ele sem lhe pagar o que está no contrato que, pese embora, possa ser um disparatado "balúrdio", terá sido o "isco" que mordeu de boa-fé.
Carlos Queiroz demonstrou não apenas ter um perfil de bom cristão, mas seguir a via da autêntica "Imitação de Cristo", como a pregaram os padres José de Anchieta, Manuel Bernardes e António Vieira, quando aceitou vir dar-se em holocausto e suportar a inevitável passagem de salvador a ovelha ronhosa num ápice, devendo saber antecipadamente que os mesmos que lhe cantaram hossanas, seriam os que, pouco depois, clamariam pela sua "crucificação", trocando-o por um qualquer Barrabás, que isto entre ladrões vai dar tudo ao mesmo.
O professor só pode merecer o nosso mais alto reconhecimento e patriótica devoção mística, demais a mais se pensarmos que a sua situação em Manchester não se resumia apenas a um qualquer "engano de alma ledo e cego".

sexta-feira, 3 de setembro de 2010

Eu bem dizia! ("Oh Elvas, oh Elvas, Badajista à voz")


Once upon a time in the very beginning of the Caso Casa Pia, ouvi nos media as razões da acusação aos arguidos e verifiquei que enquanto a esmagadora maioria eram pronunciados por crimes de abuso sexual sobre menores, uma senhora, Gertrudes Nunes, o era só "por ter casa em Elvas", o que me suscitou uma grande perplexidade. Como poderia ser crime "ter casa em Elvas"?!
Afinal o acordão deste longo caso veio dar-me razão e de todos os arguidos, apenas Gertrudes Nunes foi absolvida, tendo o douto tribunal considerado que "ter casa em Elvas" não constitui qualquer tipo de ilícito. Foi um processo de apenas (!!!) oito anos até à decisão em primeira instância a que seguirão provalvelmente outros tantos de recursos sucessivos. Extremaram-se posições, decapitou-se a direcção mais à esquerda que o PS conheceu, pronunciaram-se e despronunciaram-se pessoas, destroçaram-se vidas e até se misturaram coisas não miscíveis, como demonstraram alguns comentários muito pouco "católicos" (vindos de quem vieram) a (des)propósito da morte de Michael Jackson.
Como era de esperar "lixou-se o mexilhão" e o "Bibi" leva mais do dobro dos anos de "pildra" do que os mais penalizados de todos os outros, provando que, na prática, "Roma" continua a "não pagar a traidores" e que, à semelhança do processo das FP 25, quem se "chibou" foi quem se "prejudicou" (que estranha maneira de dizer os "efes").
Só uma coisa me anima neste folhetim judicial - a minha firme convicção de que uma réstea de bom senso haveria de prevalecer e de que ninguém seria preso só por "ter casa em Elvas".
Era só o que mais faltava!!!