domingo, 18 de maio de 2008

O público e o privado

O Ministério da Saúde lançou um plano de combate às listas de espera (mais um !...),para intervenções cirúrgicas em oftalmologia, nomeadamente às cataratas, que aposta em incentivos pecuniários aos cirurgiões de modo a "optimizar" os recursos disponíveis, ou seja, de modo a utilizar em pleno ou mais perto disso, os blocos operatórios dos hospitais públicos; pois como é do conhecimento geral, só funcionam de manhã. Aqui se começa a perceber a diferença no modus operandi entre a actual Ministra da Saúde e o seu antecessor que reflecte as diferenças de posicionamento próprio, Ana Jorge é médica, o Professor Correia de Campos não; é pois natural que a actual ministra tenda a ser mais "compreensiva" para com os médicos e os seus interesses do que o anterior ministro e talvez tenha sido este também um dos motivos que contribuiram para a sua substituição, o que é certo é que o clima de crispação e acrimónia que imperava entre os "actores" do sistema, amainou consideravelmente e deu mesmo lugar a um ambiente de "chá e simpatia", que se deverá em parte às características pessoais da actual titular da pasta, mas obviamente que não apenas. Nota-se também uma clara "desaceleração" na cinética "reformista" do Governo neste sector e é normal que não só, afinal já se perfilam no horizonte as eleições.Uma coisa é, no entanto, certa, o completo absurdo, na óptica do interesse público, da situação de falta de aproveitamento pleno dos recursos do parque existente na Saúde e o igualmente absurdo, na lógica do cidadão contribuinte, da situação de completa promiscuidade e "captura" dos recursos públicos por parte dos interesses privativos de alguns grupos, estes sim , fortemente corporativos.
Em Portugal, a bem dizer, nenhum investimento é completamente privado, quando muito em relação a alguns subsistemas, privatizam-se os benefícios e "socializam-se" os encargos, como recentemente foi, mais uma vez, demonstrado com as cirurgias mamárias feitas "à mama" no Porto. Por aí se pode verificar como a "coisa" realmente funciona, certamente que muitos dos pacientes operados e atendidos na generalidade dos Serviços ( e não só de Saúde), nem sequer passaram por qualquer lista, oficialmente muitos nem sequer "existem" e a prova dos noves é fácil de fazer: se qualquer cidadão tiver real necessidade de ser assistido ou algum familiar seu , um filho por exemplo, o que terá a fazer é marcar uma consulta no consultório particular de um médico que também trabalhe num Hospital público , a informação sobre quem é facílima de obter, em qualquer Hospital, Centro de Saúde, na lista telefónica, na internet, ou simplesmente reparando nas placas dos clínicos, ela está patente .Verá que a consulta será caríssima e ocorrerá sempre na parte da tarde, reparará que em geral, esse consultório estará escassamente equipado ou mesmo não equipado de todo, mas não haverá qualquer problema , pois o nosso doutor dir-lhe-á para na manhã, ou numa das manhãs seguintes, ir ter com ele ao Hospital e verá que sem qualquer procedimento ou registo administrativo, será, pronta e competentemente atendido.
É "trigo limpo, farinha amparo", e ainda querem melhor processo de combate à burocracia?!

PS: Obviamente que com este texto não pretendo fazer qualquer tipo de generalização que seria sempre abusiva, conheço imensos médicos sérios, dedicadíssimos, esforçados, competentes ,sábios e verdadeiramente humanistas, sou amigo sincero e desinteressado de alguns, como são os amigos, mas infelizmente todos sabemos que o processo que acabo de descrever é bem real, e eu até nem gosto assim muito de carne de avestruz , para além de achar que o bicho não me parece bom de comer, é demasiado rija !

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